quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

QUEM TEM MEDO DA CUCA?!

 

Crianças pequenas, de um modo geral, gostam de cantigas de acalanto, mesmo aquelas que trazem histórias de medo, como “boi da cara preta” e “nana nenê”. Crianças também gostam de histórias de monstros e bruxas, especialmente quando são contadas por adultos que lhes imprimem segurança.

Cantigas e histórias narradas podem oferecer aos pequenos, de um modo seguro, uma aproximação com experiências de medo, perda, ou dor. Pois, aquele sentimento que já foi sentido, ou poderá vir a ser, é ali vivenciado num espaço protegido, onde sentimentos reais são despertados através da imaginação. Histórias e canções de acalanto são como aquelas vacinas com pequenas porções de vírus, que informam ao nosso organismo que aquele ser existe, nos deixando melhor preparados para enfrentá-lo quando ele tentar nos atacar no mundo real.

É fundamental, no entanto, para este efeito terapêutico (chamo aqui de terapêutico aquilo que promove o bem estar) das cantigas e histórias, que os adultos transitem por elas de modo responsável, buscando criar, a partir da experiência compartilhada com os pequenos, uma relação de confiança e um espaço de segurança.

Muitos adultos, porém, usam cantigas, histórias e experiências cotidianas, para promover o medo. Crianças não tem medo de bruxas porque as bruxas são más, mas porque quem lhes contou estas histórias, não lhes comunicou segurança. Do mesmo modo, crianças não nascem tendo medo de dentista ou de tomar vacina. Elas aprendem a ter medo porque muitos adultos dizem: “se tu não te comportar, vou mandar essa moça te fazer uma injeção”. Cria-se uma narrativa assustadora para uma experiência desconfortável e isso gera medo e ansiedade.

No mundo da pós-verdade, andamos a ter muita dificuldade em diferenciar realidade de ficção. Sobram informações e falta interpretação de texto e contexto. Faz um tempo que temos andado de marcha à ré rumo ao futuro. Há quem questione a ciência, simplesmente porque não querer compreendê-la. Pensar não dói, mas desacomoda. Um mundo fundamentalista e dogmático é mais fácil de ser digerido, pois não há o que questionar, apenas certezas a seguir.

Andam a dizer por aí que tomar vacina altera nosso DNA, que a vacina vai provocar malformações em nossos corpos, causar doenças, nos robotizar, nos transformar em animais. Tudo isso seria divertido em uma história de ficção, mas a COVID-19 é real. A vacina é a luz no fim do túnel, num túnel que parece não ter fim. Fico pensando se não faltou ficção para toda essa gente que anda por aí a duvidar da realidade.