quinta-feira, 22 de agosto de 2019

PARADOXOS

Assim está escrito no Aurelinho (minidicionário da língua portuguesa brasileira): Pa.ra.do.xo sm. 1. Conceito que é ou parece contrário ao senso comum. 2. Absurdo. 3. Filos. Afirmação que vai de encontro a sistemas ou pressupostos que se impuseram como incontestáveis ao pensamento.
Em 1994 Gilberto Gil escreveu sobre o paradoxo de uma novidade que “veio dar à praia, na qualidade rara de sereia [e que tinha] / Metade o busto de uma deusa Maia/ Metade um grande rabo de baleia”. Dizia ele que “A novidade era o máximo/ Do paradoxo estendido na areia/ Alguns a desejar seus beijos de deusa/ Outros a desejar seu rabo pra ceia” . Gil é genial com suas palavras que brincam ao olhar para as maluquices do mundo contemporâneo, nos fazendo pensar sobre outros tantos paradoxos.
A quarta semana do mês de agosto desperta em mim sentimentos e pensamentos que podem parecer paradoxais, mas que são absolutamente complementares. Entre os dias 21 a 28 de agosto, acontece a Semana Nacional da Pessoa com Deficiência Intelectual e Múltipla, com o objetivo de abrir debates e colocar a sociedade em reflexão sobre questões que envolvem inclusão e igualdade de direitos e oportunidades.
Todos os anos, durante a Semana Nacional da Pessoa com Deficiência, é celebrado também o Dia do Folclore. E qual a relação entre o Dia do Folclore e a Semana Nacional da Pessoa com Deficiência? Eu poderia responder que nenhuma. Mas, você já reparou que muitos dos personagens de nosso folclore brasileiro trazem em seus corpos marcas distintas, que aqui no mundo real chamamos de deficiências? Ao Saci falta uma perna, à Mula sem Cabeça falta a cabeça, o Curupira tem os pés voltados para trás e a Iara um rabo de peixe.
A Semana Nacional da Pessoa com Deficiência e o Dia do Folclore não tem relação direta. Mas poderiam ter, na medida em que ambos nos chamam à reflexão para lembrar daquilo que nos torna verdadeiramente humanos, a memória, o respeito, a empatia e o cuidado.
Ao falar sobre o paradoxo da sereia, Gil ainda escreveu: Ó mundo tão desigual, tudo é tão desigual/ De um lado este carnaval, de outro a fome total E se fôssemos capazes de sonhar e criar um mundo menos desigual, com mais respeito e empatia entre todos os seres? Talvez, se acreditássemos nas pessoas como as crianças pequenas acreditam nos seres fantásticos, sem questionar suas potencialidades, apesar de suas diferenças físicas, fôssemos capazes de aprender mais uns com os outros e fazer mais uns pelos outros.